Porque é que as baleias se tornaram gigantes?
Ser grande no oceano é uma grande vantagem por três razões principais:
1) reduz a competição e predação por parte de outras espécies;
2) aumenta imensamente a capacidade de percorrer largas distâncias, tanto horizontal como verticalmente, permitindo assim, o acesso a uma muito maior área de alimentação;
3) aumenta substancialmente a capacidade de retenção de calor.
Porém, estas enormes proporções só são possíveis no oceano, uma vez que as suas enormes massas corporais são suportadas pela flutuabilidade da água. Em terra, restrições físicas, como a gravidade e mecânica dos ossos, limitam as dimensões máximas dos animais, tendo estes de ser capazes de suportar o seu próprio peso. Assim, as dimensões corporais dos cetáceos são limitados não por fatores físicos, mas por fatores energéticos e disponibilidade de alimento.
Enquanto mamíferos, os cetáceos respiram ar, tal como nós. Por esta razão devem equilibrar a sua necessidade por oxigénio à superfície com a necessidade de alimentos de maior qualidade em profundidade. A forma encontrada pela evolução para superar este problema foi precisamente através do gigantismo: à medida que o tamanho aumenta, o consumo oxigénio por unidade de massa diminui, o que significa que quanto maior o indivíduo, maior a sua capacidade de mergulho. Isto permite que estes animais se alimentem durante mais tempo em profundidade quanto maior forem, o que resulta em maiores taxas de alimentação e, portanto, em mais energia recolhida/ganha por mergulho.
Pensa-se que as baleias de dentes (Odontocetes), como os cachalotes ou as baleias-de-bico, evoluíram no sentido de dimensões corporais maiores de forma a melhorar a sua capacidade de mergulho e explorar melhor as grandes quantidades de alimento disponíveis no fundo do mar através da utilização de poderosos biosonares. Já as baleias de barbas (Mysticetes) de maiores dimensões, além de melhorarem sua capacidade de mergulho, também permitiram uma exploração mais eficiente de pequenos organismos de grande abundância nos oceanos.
No entanto, de forma a manter a eficiência energética com dimensões tão grandes, estes animais têm também grandes necessidades alimentares, sendo mesmo dos animais mais vorazes dos oceanos. De forma a atender essa grande necessidade de alimento, as baleias de dentes e de barbas desenvolveram diferentes estratégias: enquanto os Odontocetes se alimentam de presas maiores e predam um indivíduo de cada vez, os Misticetos desenvolveram uma técnica de alimentação através de um sistema de filtragem que lhes permite explorar densas aglomerações de pequenas presas, como cardumes de pequenos peixes e outros organismos de ainda menores dimensões – zooplâncton.
Embora todas as baleias pareçam ter melhorado as suas capacidades de procura de alimento ao longo do tempo com o aumento das suas dimensões, esta característica parece ter sido ainda mais benéfica para as baleias de barbas (Figura 1). No caso das baleias de dentes, as suas enormes dimensões proporcionam, essencialmente, maior capacidade de mergulho e maior alcance na detecção de presas (através de biosonares mais potentes), mas não garantem a captura de presas maiores, pois estas incorrem também em grandes custos energéticos na sua captura.
Por outro lado, nas baleias de barbas, há uma relação linear entre a dimensão e a quantidade de alimento ingerido, pois quanto maiores são, maior é o volume de água engolfada e, consequentemente, maior a quantidade de presas ingeridas – os maiores rorquais são capazes de engolfar 100 a 160% do seu próprio volume corporal.
Porque é que as maiores de todas as baleias se alimentam de animais tão pequenos?
Estima-se que os Odontocetos e os Misticetos tenham divergido entre si há cerca de 35 milhões de anos atrás, no final do Eoceno. Julga-se que os maiores motivos desta divergência estejam relacionados com a disponibilidade de alimento e preferências de habitat.
Enquanto as baleias de dentes desenvolveram biosonares extremamente eficientes, que lhes permitiram explorar melhor a vasta biomassa pelágica das águas mais longe da costa, as baleias de barbas desenvolveram uma estratégia de alimentação através de um sistema de filtragem que lhes permitiu explorar eficientemente um vasto e subutilizado recurso: agregações de grande densidade de animais de reduzidas dimensões que explodem em grande número em regiões de intensa ressurgência (up-welling) costeira (áreas de alta turbulência que provocam o movimento ascendente de grandes quantidades de nutrientes, resultando em explosões fitoplanctônicas que, por sua vez, atraiem pequenos herbívoros, gerando grandes oportunidades de captura de alimento para uma grande variedade de espécies).
Por mais paradoxal que possa parecer, foi a evolução no sentido de especialização na captura de presas de reduzidas dimensões que permitiu que as baleias de barbas se tornassem gigantescas. Ao desenvolver esta técnica de alimentação, estas baleias tornaram-se não só mais eficientes na captura de alimento em comparação com as baleias de dentes (que capturam uma única presa de cada vez), mas ganharam também acesso a enormes recursos energéticos, como são organismos de nível trófico inferior. Por exemplo, a baleia azul, o maior animal que já viveu no nosso planeta, com até 33 m de comprimento, alimenta-se quase exclusivamente de krill, um pequeno crustáceo parecido com um camarão que mede apenas 2-3 cm de comprimento.
A razão por trás desta estranha relação tem que ver com o fluxo de energia ao longo da cadeia alimentar. Quando um animal (ou planta) é ingerido por outro, apenas 10% da energia armazenada no primeiro é transferida para o segundo. Assim sendo, a captura de presas de níveis tróficos mais baixos torna-se mais vantajosa, uma vez que estes têm mais energia disponível para ser absorvida (Figura 2). Esta é também a razão pela qual a dimensão máxima dos carnívoros é, geralmente, inferior à dos herbívoros (por exemplo, o maior mamífero predador terrestre, o urso polar, tem um peso máximo de 800 kg, enquanto o maior herbívoro, o elefante africano, pode pesar até 6000kg).
Artigo escrito pelo biólogo Diogo Costa.
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Bibliografia:
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3 Comments
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